Menu
sexta, 06 de junho de 2025
Andorinha 77 anos - junho de 2025
Andorinha 77 anos - junho de 2025
COLUNA

Entrelinhas

Sylma Lima

Eleição Desigual

Emendas parlamentares, que deveriam cumprir papel na distribuição de recursos públicos, na prática, são usadas como balcão de negócios, gerando disputas desiguais nas eleições.

19 abril 2025 - 08h40

Alvo de debates no campo jurídico no Supremo Tribunal Federal, as emendas impositivas reguladas pela emenda constitucional federal n.º 126/2022 criou um sistema anômalo de gestão e aplicação de recursos públicos, com aumento de valores para o Parlamento em direcionar recursos públicos, gerando fato inusitado no contexto das competências tradicionais da tripartição de poderes, já que a função primordial do Poder Legislativo é fiscalizar o Poder Executivo e aprovar leis.

O Poder Executivo, representado pelo Prefeito no âmbito municipal, é que tem a competência constitucional para aplicar os recursos públicos, gestão e implementação de políticas públicas dentro de margem de discricionariedade para gerir os recursos públicos nos termos da representação democrática, e nas condições do orçamento e leis pertinentes.

Os valores dos recursos da chamada emenda individual impositiva foram aumentados no âmbito federal e tiveram repercussão nas Assembleias legislativas e nas Câmaras de Vereadores. É previsto para o ano de 2025 o valor de 39 bilhões de reais somente em emendas parlamentares para deputados e senadores, 72 milhões no âmbito dos deputados estaduais, e cerca de 300 mil para cada vereador em Corumbá.

Assim, estranhamente, temos visto nos últimos anos uma elevada participação de políticos do Poder Legislativo inaugurando obras, entregando ambulâncias, em reformas de hospitais, escolas, rodovias, participando de eventos acerca de transferência de recursos das tais emendas impositivas a entidades filantrópicas, dentre outras. Interessante, é que em várias oportunidades, nem mesmo o prefeito participa do evento de inauguração de obra, já que se trata de emenda parlamentar que muitas vezes nem mesmo estava no projeto político de prioridades no plano de governo do gestor maior do Poder Executivo, que no caso é o prefeito no âmbito municipal.

Neste contexto, um tema ainda pouco discutido é a dimensão e extensão desta forma de aplicação de recursos públicos na forma de emendas individuais impositivas, já que, no caso do município, o vereador tem um valor expressivo para manejar em dinheiro e a destinação dos recursos em reduto eleitoral, aumentando sua visibilidade política e criando vínculos de gratidão a pessoas e dirigentes de entidades públicas e privadas, e até mesmo já cooptando futuros líderes e eleitores para sua campanha política quando da disputa de reeleição.

Em síntese, é possível vislumbrar que foi criado um sistema desigual na disputa das eleições, onde quem já detém um cargo político no Poder Legislativo, além da projeção habitual do cargo, verbas de gabinete, etc., a exemplo de vereador, tem maior possibilidade para ampliar seu rol de influência política que vai além da normalidade institucional da atividade parlamentar, para ter poder de influência e manejo de recursos públicos expressivos se projetando no cargo e criando ambiente de expressividade eleitoral, que irá lhe beneficiar futuramente quando da disputa nas eleições regulares.

Tais verbas de emendas parlamentares são distribuídas em várias entidades da sociedade civil e órgãos públicos, com metade das emendas para área da saúde pública, criando ambiente para projeção desproporcional no tocante ao cargo que exerce, além do que não é atividade precípua do vereador (ou deputado/senador) a destinação de recursos públicos, e sim exercer as funções legislativas e de fiscalização do Poder Executivo. Contudo, com as emendas individuais impositivas no formato atual, políticos do Legislativo têm se apropriado de parte do orçamento público de duvidosa legitimidade política nos termos democráticos da representação popular e competências constitucionais.  

Em Corumbá foi acrescentada emenda a Lei Orgânica do Município o Art. 131-A do ano de 2022 que disciplina de modo geral as emendas impositivas, alvo de constantes controvérsias e embates com o prefeito, diante de atrasos na liberação de tais emendas pelo gestor municipal, e fazendo parte do jogo político de negociações. Inclusive, esta emenda trouxe previsão de que a não execução orçamentária das emendas parlamentares implicará em crime de responsabilidade, e poderá ensejar cassação do mandato do prefeito pelos vereadores. São quinze vereadores em Corumbá, e cada um tem sua cota de emenda parlamentar para conduzir e direcionar a entidades públicas ou privadas que tenha convênio para gerir recurso público, e o Executivo tem a obrigação legal de liberar tais recursos.

As emendas parlamentares deveriam ser de grande valia no contexto da distribuição de recursos se aplicado de modo coerente, transparente e probo, já que são os vereadores da cidade que - em tese - conhecem os problemas mais urgentes e resolução de pendências e omissões do Executivo, em dada situação fática, e nos diversos campos das necessidades públicas. Porém, na prática, tais atribuições estão acima da normalidade da atuação do parlamento, gerando indícios de disputas desiguais em eleições futuras, dificultando a renovação da Câmara com novos nomes, ideias e projetos.

Uma medida salutar seria adotar total transparência com relação aos valores das emendas, destinação exata com nome e endereço, nome de vereador, o plano de trabalho da entidade beneficiária, datas e demais extratos e dados do recurso liberado. Assim, evita qualquer sombra de dúvidas e traz legitimidade e controle social deste importante mecanismo criado e agora em evidência e aumentado os valores das emendas parlamentares. Não há espaço para “orçamento secreto” ou qualquer subterfúgio no trato de recursos oriundos dos impostos pagos pela população.

Receba a coluna Entrelinhas no seu Whatsapp. Clique aqui para seguir o Canal do Capital do Pantanal.

 

 

Deixe seu Comentário

Leia Também

O FAS evoluiu ou murchou?
Pena de morte na Delegacia
BO de ameaça contra vereador
Ataque aos aposentados
Danças das Cadeiras